Na linha de frente do combate à pandemia
Entrevista
Desde que a pandemia de Covid 19 começou, em dezembro de 2019, os profissionais de saúde do mundo inteiro entraram em alerta. Estando na linha de frente seriam muito afetados. Entramos no terceiro ano da pandemia e não sabemos se será o último. Se essa incerteza abala a maioria da população mundial, como estão os profissionais que lidam diária e diretamente com a doença? O aumento de contaminados com a variante Ômicrom voltou a exigir muito dos profissionais e do sistema de saúde. Um dado alarmante, divulgado dia 3 de fevereiro, pela Associação Médica Brasileira, revelou que 9 em cada 10 médicos brasileiros, foram contaminados por Covid 19, nos últimos dois meses. Os profissionais de enfermagem são os que lidam diretamente com o paciente e seus familiares, passam informações diárias sobre o estado de saúde das pessoas internadas por Covid 19. Dos trabalhadores da enfermagem, em torno de 85% são de mulheres, segundo dados do Cofen (Conselho Federal de Enfermagem).
O aumento de contaminados com a variante Ômicrom voltou a exigir muito dos profissionais e do sistema de saúde. Um dado recente alarmante, divulgado pela Associação Médica Brasileira, revelou que 9 em cada 10 médicos brasileiros, foram contaminados por Covid 19, nos últimos dois meses.
Entrevistamos Claudia Zan, enfermeira, 57 anos, um filho de 14, formada em 1986 na Faculdade Barão de Mauá, em Ribeirão Preto/SP, com pós-graduação em Administração Hospitalar, Gestão de Negócios em Saúde, Terapia Intensiva e Auditoria. Trabalhou no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, no Hospital São Lucas por mais de 15 anos, na Santa Casa de Sertãzinho/SP e atualmente dá aulas práticas para técnicos de enfermagem, em uma das UPAs de Ribeirão Preto, maior cidade da região, que recebe pacientes de muitos municípios vizinhos. A Prefeitura de Ribeirão Preto contratou 80 profissionais da saúde no início de 2022, devido ao aumento de contaminação nas equipes. Ribeirão é a cidade que mais possui profissionais da rede pública de saúde afastados por gripe ou Covid na região: são mais de 200 servidores de diferentes funções, só no mês de janeiro.
MIM: Você atualmente trabalha na UPA com sua turma, você voltou após o início da pandemia?
Claudia Zan: Sim, é onde eu dou estágio para os alunos. Sou aposentada e hoje dou aula prática para formação de técnicos de enfermagem no Colégio Projeção. Logo no começo da pandemia os estágios foram suspensos e voltamos em setembro do ano passado. Desde então estou com eles na UPA.
MIM: E como tem sido essa experiência numa das principais cidades do Estado de São Paulo, que atende vários municípios da região?
CZ: Apesar de estarmos todos vacinados (professores e alunos) tem sido uma experiência que envolve dedicação e coragem, pois estamos expostos a essa realidade de atendimento a inúmeros pacientes diagnosticados com Covid e muitos deles aguardando (por dias) uma vaga para internação. Muitas vezes não temos como acomodar pacientes para que possam receber medicação e atendimento para que possa amenizar os sintomas.
Além disso, temos visto uma redução drástica no número de profissionais que também se infectaram e estão afastados. Muita mão-de-obra diminuída. Já chegaram a 17 profissionais afastados , 10 positivo para Covid e 7 esperando confirmação. Hoje já mudou esse cenário, muda todo dia. O que acontece de mudança de turno é impressionante, o pessoal faz 12h, 18, 24 horas seguidas para cobrir o outro que está afastado. É um desafio enorme, é trabalhar além do limite.
MIM: Mas apesar do aumento de número de casos, vemos que a doença tem se desenvolvido de forma menos agressiva nas pessoas vacinadas. Mesmo assim ainda há muita gente que não acredita na eficácia de vacina. Como você argumenta com essas pessoas?
CZ: Sim, ainda são muitos os que não acreditam nas vacinas. Mas insistimos, mostrando a diminuição dos números de casos graves para aqueles que estão vacinados. E números não mentem! Além disso, ainda há quem não respeite os protocolos de segurança e resiste em usar máscaras. É bem desanimador…
MIM: E como você faz para lidar com esse desânimo? Como você tem tratado da saúde mental?
CZ: Acredito que esse seja o lado mais difícil dessa história toda. Temos que respeitar o outro e, quando percebemos que cada atitude desse tipo coloca em risco a saúde e a vida de tantos outros, a nossa saúde mental fica bem prejudicada. Procuro incentivar os meus alunos a buscarem atividades que recarreguem suas energias e a acreditarem que cada atitude positiva e correta que tomam pode “contaminar” positivamente alguém. Mas, sinceramente, manter a mente sã tem sido a parte mais difícil nesse caminho pela pandemia. Sem contar a dificuldade em ter acesso aos recursos materiais, que muitas vezes estão em falta!
MIM: E por que você escolheu essa profissão?
CZ: Porque amo cuidar! Desde sempre esse foi o meu maior dom… Sempre busquei oferecer o meu melhor a quem precisa e ser enfermeira é, pra mim, a forma mais nobre de poder oferecer apoio. A enfermagem está do lado do paciente o tempo todo, acompanha, assiste, sente junto as dores. É o profissional que está do lado, que limpa, alimenta, que conforta, transporta. Quando o paciente não pode, a gente tenta fazer por ele, vivemos um pouco o que o paciente está vivendo. A gente tenta se blindar de algumas coisas, que são sentidas por eles, para não se tornarem as nossas dores também. Mas muitas vezes não conseguimos e sofremos junto. É um pouco viver a dor de cada um, mas tentando separar, porque já temos as nossas. Quem não tem? A gente tenta dar um novo sentido para aquilo tudo que a pessoa está passando, é mágico. A nossa profissão foca nos detalhes e muitas vezes são nesses detalhes que o médico encontra o diagnóstico.
MIM: Você acha que a pandemia aumentou o interesse dos jovens pela área de saúde?
CZ: Acredito que sim… Pelo menos daqueles que tem essa vocação e que descobriram, em meio a essa pandemia, a “urgência” de se encontrar quem queira fazer mais pelo próximo! A enfermagem é se colocar junto no lugar do outro. Essa é nossa missão!
MIM: O Projeto Mulheres Iluminando o Mundo agradece todo o seu empenho, representando aqui os profissionais da saúde nessa linha de frente. Tem alguma mensagem que você gostaria de deixar?
CZ: Eu agradeço muito a oportunidade de poder mostrar um pouco do que estamos vivendo! Desejo que essa experiência ímpar que todos nós estamos experimentando possa fazer crescer cada vez mais a empatia, tão necessária hoje e sempre. E peço, mais uma vez, que se vacinem.