Fatos e mulheres que simbolizam 8 de março
A importância do Dia Internacional das Mulheres para lembrar as lutas para conquistar direitos das mulheres e pioneiras, que lideraram movimentos feministas
O dia 8 de março é uma data para comemorar as conquistas femininas, como direito ao voto ou o trabalho remunerado. O marco oficial para a escolha desta data foi uma manifestação das mulheres russas por melhores condições de vida e trabalho, em 8 de março de 1917, que contou com mais de 90 mil manifestantes. Como ocorreu durante a Primeira Guerra Mundial ficou conhecida como “Pão e Paz”.
Mas, a luta das mulheres por melhores condições de vida e trabalho começou a partir do final do século XIX, principalmente na Europa e nos EUA. As jornadas de trabalho de 15 horas diárias, os baixos salários e a discriminação de gênero eram alguns dos pontos debatidos pelas manifestantes da época. Registros históricos mostram que o primeiro Dia da Mulher foi celebrado nos EUA, em maio de 1908, onde mais de 1.500 mulheres se uniram pela igualdade política e econômica no país. E em agosto de 1910, a jornalista e política feminista Clara Zetkin propôs a realização anual de uma jornada pela igualdade de direitos das mulheres, sem uma data específica.
Na verdade, vários acontecimentos levaram à criação de um dia especial para as mulheres. Um deles foi o incêndio numa fábrica de camisas em Nova York, em 25 de março de 1911, que mataria 146 pessoas, sendo 129 mulheres. O grande número de vítimas foi resultado das péssimas condições de trabalho e porque uma porta estava fechada para impedir a fuga das trabalhadoras.
Também nas primeiras décadas do século XX, as mulheres começaram a lutar pelo direito ao voto e à participação pelo voto. Apesar disso, por muito tempo, a data ficou esquecida, mas foi recuperada com o movimento feminista dos anos 60. Mesmo assim, a ONU só reconheceu o Dia Internacional da Mulher em 1975.
Mas, o importante, é que se tornou uma data para lembrar conquistas e que ainda temos muito para alcançar a igualdade desejada. Muitas mulheres vieram antes, defendendo causas que tornaram esse dia um símbolo de luta por igualdade de gênero. É sempre bom lembrar e honrar seus nomes.
Ela nasceu em 1894 e é considerada uma das mais importantes figuras na luta feminista brasileira e latino-americana do século XX. Bióloga, educadora e diplomata, Bertha empenhou-se na causa do direito feminino ao voto e junto com outras mulheres, criou, em 1919, a Liga para a Emancipação Intelectual da Mulher. Três anos depois a Liga transformou-se na Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF). Em 1932 conseguiu, com outras ativistas, que o então presidente Getúlio Vargas assinasse o direito ao voto feminino. Bertha também organizou o primeiro congresso feminista brasileiro.
Daí não parou mais. Tornou-se deputada na Câmara Federal em 1936 após a morte do titular Cândido Pessoa, de quem era suplente. Na Câmara, continuou sua luta pela igualdade salarial, pela redução da jornada de trabalho (que era de 13 horas por dia) e pela licença maternidade de 3 meses.
Também foi integrante da delegação brasileira que participou da Conferência das Nações Unidas sobre Organização Internacional, nos EUA, em 1945. Sua missão de incluir menções sobre igualdade de gênero no texto da Carta das Nações Unidas.
A primeira feminista brasileira, por documentos históricos, foi Dionísia Gonçalves Pinto, que nasceu em 1810, na pequena cidade Papari (RN). Quando começou a escrever, adotou o pseudônimo de Nísia Floresta Brasileira Augusta. Na época, as mulheres foram inseridas na alfabetização, assim interessando-se pela leitura. Alguns homens perceberam esse interesse e apressaram em oferecer jornais destinados ao público feminino.
Na época, as mulheres foram inseridas na alfabetização, assim interessando-se pela leitura. Alguns homens perceberam esse interesse e apressaram em oferecer jornais destinados ao público feminino.
Mesmo havendo uma imprensa própria para mulheres, quem dirigia e escrevia eram apenas os homens. Isso mudou em 1831, quando Nísia começou a escrever para O Espelho das Brasileiras, jornal editado em Recife. Em 30 publicações, todas com Floresta como redatora, o jornal expunha as condições precárias das mulheres e defendia a instrução moral e cívica das mesmas.
Nísia passou muito rápido da escrita jornalística para a literária. Seu livro de estreia (Direitos das Mulheres e Injustiças dos Homens) foi publicado apenas um ano após sua participação na imprensa. Foi o primeiro escrito por uma mulher no Brasil.
A carreira literária de Nísia abordava assuntos como abolição, direitos indígenas e sufrágio. Mas seu principal tema e também, de maior repercussão (negativa e positiva) foi educação e emancipação feminina. Na época, a educação era negada às mulheres por ser considerada desnecessária, mas Nísia mantinha o argumento que elas precisavam da educação para serem livres. Por isso fundou, em 1838, no Rio de Janeiro, um dos primeiros colégios exclusivos para meninas, o Colégio Augusto. Hoje, a cidade em que nasceu, tem leva seu nome.
Ela foi a primeira deputada federal brasileira, em 1934, na primeira eleição em que as mulheres puderam votar! Também foi educadora, médica e escritora. Currículo invejável até para os homens do começo do século XX.
Carlota sempre estudou em instituições públicas e se formou no magistério em 1909. Além da liberdade de certa independência financeira, ser professora a fez refletir e buscar uma forma de tornar o ensino mais democrático. Seus estudos sobre educação foram apresentados em congressos internacionais no início dos anos 1920. Paralelamente, estudava para mudar de carreira. Mesmo assim estava desiludida com a profissão e decidiu mudar de carreira. Em 1920, aos 28 anos, matriculou-se na Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo. Depois transferiu para o Rio de Janeiro, onde encontra um ambiente menos provinciano.
Após o diploma veio o desafio de conseguir trabalhar como médica. A maioria já estava acostumada com enfermeiras, mas uma mulher dizendo o que fazer era outra história. Mesmo assim, exerceu a medicina até o fim da vida, em diversas instituições, reconhecida tanto na prática quanto na pesquisa.
Mas ainda era pouco. Neta e filha de homens filiados a partidos, sempre viu a política como mudança social e entrou na luta pelo voto feminino. A Revolução de 1932, apesar da derrota, foi uma vitória moral, pois fez com que o então presidente, Getúlio Vargas, levasse adiante a promessa de criar uma democracia. Começando pelo direito ao voto e à candidatura feminina. Em 1933 aconteceram as eleições para a Assembleia Constituinte. Das 22 cadeiras da bancada paulista, a Chapa Única por São Paulo, elegeu 17 nomes. E entre eles estaria a primeira mulher a assumir um cargo legislativo no Brasil: Carlota teve 5 311 votos no primeiro turno e 176 916 no segundo. Seguiu como médica e deputada, onde trabalhou por mudanças no sistema de educação e de saúde.
Maria Lacerda de Moura nasceu em 1887 e faleceu em 1945, mas suas ideias e trajetórias seriam consideradas pioneiras ainda hoje. Foi professora, escritora, anarquista e feminista. Cresceu em Barbacena, MG, com espíritas e anticlericais.
Começou a publicar crônicas em um jornal local em 1912 e em 1918 teve o primeiro livro publicado, Em torno da educação, com crônicas sobre o tema. Nesse período, conheceu José Oiticica e teve contato com as ideias pedagógicas inovadoras da médica feminista Maria Montessori. Mudou-se para São Paulo em 1921 e lá teve seus contatos com o movimento associativo feminino e o movimento operário da época. Chegou a colaborar com a feminista Bertha Lutz e presidiu a Federação Internacional Feminina. Mas rompeu com os movimentos associativos feministas, fundamentalmente preocupados com o sufrágio feminino, criticava o feminismo por não acolher mulheres negras e pobres. Inclusive, ela criticava todos os movimentos políticos que participava: o comunismo, por pregar hierarquias excessivas e o anarquismo por não aproveitar boas estratégias de outros sistemas políticos.
Entre 1928 e 1937, viveu em uma comunidade agrícola em Guararema, no interior de São Paulo, formada por anarquistas individualistas e desertores espanhóis, franceses e italianos da Primeira Guerra Mundial. Foi o período de sua vida em que mais produziu e atuou, colaborando semanalmente no jornal O Combate de São Paulo e polemizando com a imprensa fascista local. Participou de conferências no Uruguai e na Argentina, fez conferências pacifistas e desencadeou a campanha antifascista nas cidades de São Paulo, Santos, Campinas e Sorocaba.
A pioneira Maria Lacerda de Moura tratou de temas como a condição de desigualdade feminina, amor livre, direito ao prazer sexual, divórcio, maternidade consciente, prostituição, combate ao clericalismo, ao fascismo e ao militarismo.
Nascida em Belo Horizonte (MG), filha de ferroviário com uma empregada doméstica indígena, foi a penúltima de 18 irmãos. O pai morreu quando ela ainda era criança. Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1942, aos 7 anos, graças ao irmão Jaime de Almeida, que foi convidado a jogar no Flamengo. Lélia trabalhou como doméstica e babá, mas lutou para escapar do esquema familiar de estudar até o primário e depois “batalhar trabalho”. Lélia queria muito aprender e graduou-se em História, Geografia e Filosofia. A partir do seu doutorado em Antropologia Política, dedicou-se a pesquisas sobre relações de gênero e etnia e passou a defender um feminismo afro latino-americano.
Seus livros e artigos foram produzidos em um período (anos 1980) que necessitava movimentos sociais. Ela se preocupava em articular lutas sociais mais amplas, com demanda específica dos negros e, em especial, das mulheres negras.
Foi pioneira nos estudos sobre Cultura Negra no Brasil e co-fundadora do Instituto de Pesquisas das Culturas Negras do Rio de Janeiro (IPCN-RJ), do Movimento Negro Unificado (MNU) e do Olodum. Ao se especializar em etnia e gênero passou a militar em defesa da mulher negra, integrando o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), de 1985 a 1989. Foi candidata a deputada federal duas vezes, ficando como primeira suplente em ambas.
Lélia Gonzalez tornou-se referência e inspiração para muitas intelectuais, como a filósofa estadunidense Angela Davis que, ao visitar o Brasil em 2019, afirmou que os brasileiros precisam reconhecer mais a pensadora Lélia Gonzalez. “Por que vocês precisam buscar uma referência nos Estados Unidos? Eu aprendo mais com Lélia Gonzalez do que vocês comigo”, resumiu Angela Davis.
Apesar de ter nos deixado cedo, em 1994, aos 59 anos, também deixou um imenso legado.